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Experimentalista

Um guia, uma ideia, uma sugestão, ou apenas um sítio onde vir dar um passeio

Experimentalista

Um guia, uma ideia, uma sugestão, ou apenas um sítio onde vir dar um passeio

Qua | 28.06.17

O ano dos 64

Sarah

Por mais que eu queira, depois de um dia de cão, sentar-me ao computador a escrever sobre a minha vida e sobre o mundo, o mundo não pára e parece que nunca o assunto é o mais actual. 

No último mês, várias coisas aconteceram mas nad, é para mim tão intenso, me magoa tanto por dentro, como o caso dos incêndios em Pedrógão. 

Ainda não sei o que escrever, ou como escrever, sobre uma estrada fantasma, de onde apenas restam as sombras de queimaduras no alcatrão. Antes as casas, os terrenos, até mesmo o gado que sabe como fugir do fogo. Mas nunca uma estrada com sombras negras no chão.

Apenas assisti uma vez a um incêndio, devia ter uns 10 anos, e o que mais retive desse momento de aflição, de gritos, de carros dos bombeiros com os pneus a derrapar e onde uma senhora gritava tão mas tão alto, foi o som do fogo a queimar a madeira. A madeira chorava, era audível a sua dor, com os permanentes estalos sonoros e assobios do fogo que lhe comia as entranhas. O fogo uivava ruidosamente enquanto a madeira deixava sair a sua dor e eu nunca mais esqueci este som. 

Não sei se já é altura de apurar culpados, de expiar a dor inflingindo a outros, aos que ficaram, aos que não cuidaram dos seus terrenos, aos que não abandonaram as casas, aos que não garantiram que a tecnologia não falhava, aos que deram a ordem errada. A estes, pelo menos a muitos deles, ter sobrevivido ao incêndio do Pedrógão já vai ser penitência suficiente até que a morte os leve para outro local. 

Para mim, como Churchil de forma brilhante disse, é apenas "altura de enterrar os mortos e cuidar dos vivos". Apenas isto. Fazendo mega concertos ou dando um abraço apertado. É altura dos que, como as árvores, estão mortos por dentro mas de pé. 

Que 64 vidas tenham sido suficientes, pois foram dolorosamente demais. 

Sarah

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